INTRODUÇÃO
Petrópolis é uma cidade situada no Estado do Rio de Janeiro, entre as coordenadas 43º00´ - 43º15´W e 22º 15´ - 22º30´S, localizada a 68km da cidade do Rio de Janeiro e a 100 km de Juiz de Fora. Clima de temperatura amena, considerado tropical de altitude. A cidade também é conhecida como “Cidade Imperial” devido à sua história ligada à Coroa Portuguesa.
Os laços entre a região e corte portuguesa remontam ao ano de 1822, quando D. Pedro I, a caminho de Minas Gerais, se alojou na região e ficou encantado com o clima e a natureza do lugar. Acabou por adquirir, em 1830, uma propriedade próxima, a Fazenda do Córrego Seco atual centro histórico da cidade de Petrópolis. Seus planos seriam a construção da sede do governo imperial no verão. Apesar disso, com a Abdicação os planos foram adiados. Passados alguns anos, duas centenas de alemães aportaram no Rio de Janeiro e foram empregados pelo major engenheiro Júlio Koeler nas obras que efetuava na região, obras de recuperação da Calçada da Pedra, no “caminho novo”, compreendida entre o porto da Estrela até alcançar o alto da Serra. Por essa altura, chegam ao Brasil dois mil alemães contratados pela firma de Charles François Delrue e o major viu nesse momento a oportunidade da criação de uma colónia nas terras do Córrego Seco, que teria o auxílio financeiro do Tesouro provincial, no documento autorizando o arrendamento, estava exposto a clausula que previa a construção de um palácio, igreja e da colónia [1]
As premissas estavam lançadas para erguer uma cidade de cariz imperial e dentro da visão colonial para o Brasil Império a meio do século XIX. O estudo deste artigo visa entender se “modelos de urbanizar portugueses” de alguma forma permaneceram no projeto que começou por decreto, por uma memória do que iria ser a vila imperial.
A cidade de origem portuguesa, era uma cidade adaptada a condições físicas dos seus locais de implantação, à topografia, à hidrografia e às condições ambientais. A cidade era hierarquizada e facilmente legível, os caminhos pensados para ela, por isso fáceis de percorrer. Adaptadas ao clima e a não sujeição a rígidos princípios geométricos. A cidade de origem portuguesa, era maleável e adaptável as diferentes circunstancias que teve que responder ao longo do tempo. Os princípios que estiveram na base da estruturação da cidade, são os elementos que revelam a permanência, as invariantes, do urbanismo português. Podemos então inferir pontos basilares para esse domínio: A escolha criteriosa do sítio, a adaptação ao local, a localização dos edifícios singulares, a geometria dos planos, as hierarquias urbanas e, as praças. [2]
A cidade foi planejada e erguida como capital suburbana do império. Marcada como um campo de poder, um espaço caracterizado por relações de poder historicamente delimitadas [3]
FORMAÇÃO DA CIDADE BRASILEIRA NO PERÍODO COLONIAL.
Segundo o estudo de Walter Rossa o urbanismo colonial português, por suas invariantes, pode permitir uma identificação a uma escala global [4]. É nessa linha que se interpretará a história do urbanismo no Brasil da época. Aquando da expansão ultramarina, do Magreb a Diu, não existia diferença entre disposições militares e urbanizadoras, era uma rede de pontos comerciais colocados em fortalezas, estrategicamente colocados em rotas de navegação. Dessa forma se consolidou um sistema de praças de guerra e comércio. Os povoados que resultavam, sustentavam o fluxo comercial em escalas globais, por mar ou por terra e que já resultaria em um sistema de urbanismo regular, assente nas póvoas medievais e de autoridade tutelada pelo poder central. Não se tratava de um modelo, era um modo de fazer, foi uma cultura que existiu antes do Renascimento e foi até ao século XVI. [5]
A análise de Beatriz Siqueira Bueno coloca que, até ao século XVI, na análise à ocupação e posse dos territórios do ultramar pelos impérios mercantis europeus, é necessário vincular os interesses econômicos, política de colonização, política de urbanização e urbanismo. Portugal estava até então, focado no lucrativo comércio de mercadorias com o Oriente – especiarias e artigos de luxo. A preocupação e interesse pelo o Brasil surgiu com a ameaça eminente, pela presença de franceses e ingleses, na costa brasileira e, também, pela crise das atividades mercantis da época. [6]
A principal condicionante no urbanismo do Brasil colonial foi precisamente o processo de colonização português. Decorrente deste processo está a estrutura urbana que permitiu a formação de comunidades, de camadas, de uma economia e mercado urbano. Marcante é a grande fatia rural brasileira que, por um lado, fomentava a economia da Europa e que se refletia na vida citadina europeia, por outro, coibia o progresso urbano-rural local. A disseminação dos colonos pelos engenhos, concorria para o enfraquecimento da rede urbana pois, a administração do território estava sobe tutela dos donatários, com alçada para: doação de terras, aplicação de taxas, controle sobre ir e vir, responsabilidades militares e investimentos na economia local. Fora dessa regra estavam apenas as cidades reais, fundadas por enviados da corte e cuja fixação era em locais específicos. [7]
A crise do açúcar, nas primeiras décadas do seiscentos, originou uma reorganização da economia e da administração pela coroa, centralizando na corte o poder. Para tal, foram transferidos para os núcleos coloniais funcionários régios, engenheiros militares e elementos de tropas portuguesas, para controle comercial e territorial. Desta forma começa a se firmar uma economia urbana e a definição de camada social pelos que se fixavam na cidade – comerciantes e outros profissionais. A consolidação de povoados, fundação de vilas, era responsabilidade dos governantes e os centros regionais estabeleciam-se nas cidades reais e assim se delineava uma hierarquia urbana, uma rede urbana. [8]
A crise anterior fomentou a busca por outras divisas, o sonho português de descoberta de metais preciosos. O incentivo à busca de tais minérios remonta o período Filipino, e amplificada a partir de 1668. Os resultados surgiram nos fins do século XVII. [9]
Até ao início do século XVIII, no que concerne ao traçado urbano, existia uma quase ausência de regularidade. O que existia era uma certa valorização da praça e edifícios de maior interesse bem como vestígios de zoneamento a partir de programas comuns encontrados em alguns edifícios. Na perspectiva de que o processo de conceber o espaço construído tende a ser um processo cada vez mais à priori, surgem as figuras do engenheiro militar, o projetista, e o do ruador, que executava as ordens dos primeiros. A existência de um direcionamento, uma legislação portuguesa – tratados e ordens régias – fundamentará a defesa da existência de um processo planejado. A “forma” decorrerá de uma dinâmica de fatores, os fundamentos políticos, económicos, culturais, situação histórica e os direcionamentos da coroa, haveria assim, indícios para a constatação de um planejamento à priori. [10]
Desde as descobertas, que Portugal aposta na definição e presença do Estado no seu território, com reformas urbanas nas principais vilas e cidades. O principal método foi a criação de legislação que determinava imposições para fachadas, uso de materiais, largura de ruas, dimensão de lotes e foi até à sugestão de uma nova centralidade, a praça. Essa componente urbana, era de grande acessibilidade e acompanhada de edifícios principais como, mercados, câmara, pelourinho, alfandega, etc.. Existia o conceito de monumentalidade, por onde as cidades eram hierarquizadas, existiam centros regionais que se orientavam a pontos nodais do império: Lisboa, Goa, Salvador e Rio de Janeiro. [11]
Com o estudo dos programas de urbanização do século XVIII, existe a defesa da existência de uma política específica de planejamento para o Brasil colônia. A metrópole para promover o controle sobre a colônia, implementou novas regras urbanas e de comportamento, que refletiriam o bom governo. Os argumentos de fundo seriam o respeito a um ideal iluminista, uma sociedade civilizada à luz da europeia, valores aos quais os colonos se deveriam comprometer. [12] O planejamento formalizou-se em um sistema de cidades, vilas e povoações. A intensão desse sistema urbano era o controle do território, desde o litoral até ao interior profundo. A reforma iniciada em período joanino pretendia conter a força dos poderosos, ter controle sobre os “aventureiros”, regulamentar áreas auríferas, estabelecer colônias na Amazônia e reduzir a população errante. A consolidação da rede urbana, significaria uma colónia mais resistente a invasores, nomeadamente os espanhóis. [13]
Será através da leitura de cartas que é possível averiguar que desde a implantação das primeiras povoações a recorrência de alguns fatores: situação geográfica litorânea (junto a um porto seguro, em baías, ou beira de rios), ligação a um ou mais eixos fluviais que facilitassem a interiorização e articulação com regiões férteis visando a economia de exportação; escolha de sitio elevado por questões de defesa; existência de água abundante para abastecimento da população. Podendo ser feito o paralelo com o urbanismo português europeu como empregue em Lisboa (barra do rio Tejo), no Porto (barra do rio Douro), em Coimbra (barra do rio Mondego). Com esta análise, as opções não foram aleatórias ou irracionais, como chamadas na comparação com o “tabuleiro de damas” da América Espanhola. A política aplicada, conciliava variáveis relacionadas à lógica das economias vigentes. Olhando para o início da colonização, os primeiros núcleos urbanos litorâneos do Brasil, contribuíam como polos administrativos e religiosos intermediando a produção de uma vasta região, repleta de sesmarias, com a Metrópole e outros pontos da colônia, através de rios e afluentes [14]. Havia assim, lógicas que orientavam a construção dos núcleos urbanos coloniais que iam para além do traçado ortogonal. As vilas e cidades materializaram-se mediante um conjunto de princípios e procedimentos que hoje chamamos de urbanísticos, nem sempre especificados no papel, mas difundidos pelo costume e em parte codificados pelas Ordenações do Reino de Portugal. Parafraseando Rossa, um “urbanismo regulado”, mais do que “regular” [15].
Fator importante nesse conceito de regularização das povoações em vilas, é a maior coleta de impostos. Nessa proposta “reguladora” do espaço resultam ruas retilíneas, praças e elementos arquitetônicos uniformes, ou seja, o conceito era adaptável às condições locais. Como evolução desse processo surgem também jardins públicos e alamedas que permitem ventilar os centros urbanos o que tendeu a ser padrão para toda a nação. [16]
A cidade portuguesa dos finais do século XVIII traduz a evolução da cultura de arquitetura colonial, aprimorada pelo aprendizado da reconstrução de Lisboa no terremoto de 1755, tanto na estrutura urbana, como na utilização de módulos arquitetônicos. A praça da cidade portuguesa tem valor central e nela deverão estar os edifícios de maior interesse público, no caso do século XVIII: a igreja, a câmara municipal e a casa de guarda. O caso de Vila Real de Santo António, originou-se como estratégia económica, política e territorial de afirmação do estado português, face ao estado espanhol. Neste caso específico, prevaleceu o desejo do Marquês de Pombal em atender a dois objetivos fundamentais: o controle do negócio das pescas e a afirmação do poder régio [17]
As influencias que poderão estar presentes nas vilas e cidade do Brasil colonial, medievais, renascentistas ou barrocas merecem uma discussão cuidada, a presença ou ausência de traçados também possui conteúdo, como colocado por Milton Santos a “revanche das formas”. Um possível caminho, será a análise do planejamento como ideia de futuro, como foi tratado o processo entre pedido e execução dos planos. No medievalismo, o urbanismo orgânico era o retrato que Deus era o responsável pelo destino, o Renascimento representa o projeto à escala do homem e o Barroco devolve a incerteza do porvir. O projeto à priori carrega consigo o desígnio de controlar o futuro. [18]
POLITICA DE URBANIZAÇÃO PARA O BRASIL IMPERIAL
O projeto de criação dos núcleos coloniais estava em consonância com a política imperial de povoamento e de urbanização. O programa era norteado pelas Companhias de Colonização que através da imigração pretendiam a mestiçagem da Nação, obtenção de mão de obra qualificada, e que deveria resultar em um processo civilizatório, com práticas de organização espacial e planejamento. A política territorial do império, era fundamentada a partir da unidade nacional, consolidava-se com a exploração rural e com a existência de uma aristocracia composta por esses homens poderosos, sobretudo sobre a população interiorana, ligados por negócios comuns e que estavam no círculo do imperador. Essa aproximação ao Imperador, e gentes da corte, conferia de alguma forma estatutos reais a esse grupo e dessa forma uma cooperação com o Poder Central. Foi por intermédio dos latifundiários, seu prestigio e poder, que se proporcionaram as ações civilizatórias. A política imperial de povoamento, é a transição entre dois regimes jurídicos de propriedade. Por um lado, o abandono do regime de sesmarias, e com ele seu modo de colonizar, a favor do Estado Imperial, cuja política fundiária definiria a nova abrangência de público e privado e isso marcaria a nova dinâmica do capital. O século XIX repensou a colonização e apontou para um Brasil mestiço. [19]
POLITICA DE URBANIZAÇÃO PARA A REGIÃO SERRANA DO RIO DE JANEIRO
Desde o final do século XVII que o processo de ocupação da região serrana da Província Fluminense está ligado com as atividades mineradoras e a abertura de caminhos entre esses polos produtores e o litoral o que, acaba por alavancar outras atividades como manutenção de ranchos e roças, abertura de estalagens e locais de comércio. Entre o século XVII e o início do século XIX, ainda em uma escala local, a metrópole espraia-se para o interior com pequenas propriedades, através de foros, e os caminhos resultaram para facilitar esse fluxo abastecedor regional. A produção agrícola expandiu-se e a fronteira agrícola a acompanhou pelo processo latifundiário. As técnicas utilizadas na produção de café, demandou a inclusão de novas terras, o Estado alinhado com as necessidades dessa escala de produção e propriedade, propiciou a abertura de novos caminhos e a criação de novas vilas. A política urbanizadora com início no período joanino visou a integração do território pelo Estado, visando o que resultou o impulso pelo comércio do café, o processo agora é de povoamento. [20]
Face a nova reorganização urbana, a fazenda do Córrego Seco foi adquirida em fevereiro de 1830, por Dom Pedro I. A propriedade pertencia ao sargento-mor José Vieira Afonso e esposa Rita Maria de Jesus. Nessa altura o objetivo era a construção de um palácio de verão. Com a abdicação, o projeto ficou parado. A propriedade foi arrendada a Robert Malpas, depois a Antônio Joaquim Tinoco e só depois a Júlio Frederico Koeler, quando já era propriedade de Dom Pedro II [21]. Júlio Frederico Koeler, nasceu em Mayença, capital do ducado do Reno do Grão-Duque de Hesse (Darmstard). Ingressou no exército prussiano chegando a alferes. Em 1828, é contratado pelo Barão de Shaeffer para servir o exército brasileiro, onde chegou ao posto de major sempre envolvido com as políticas urbanas do Brasil Imperial, a principal foi precisamente a criação da Vila Imperial de Petrópolis alinhada com os processos de urbanização e colonização do oitocentos [22].
VILA IMPERIAL DE PETRÓPOLIS, FUNDAÇÃO POR DECRETO EM 1843.
Em sequência o projeto de colonização foi assinado por Dom Pedro pelo decreto-lei 155 de 16 de março de 1843, onde autoriza o mordomo Paulo Barboza a arrendar a fazenda a Koeler com a finalidade de assentamento de uma povoação, da construção de um palácio, de uma igreja de um cemitério e um núcleo colonial. Pelas motivações, o núcleo colonial terá dado origem à cidade. Possivelmente a exemplo das colônias do sul do país mostra as alocações militares para chefia de núcleos agrícolas como defesa e justificaria a nomeação de Koeler como diretor da colônia. Discorrendo ainda sobre o decreto 155, artigo 1º parágrafo 1º do contrato de arrendamento, menciona a nacionalidade que deveriam ser os colonos: portugueses, belgas, franceses, italianos, espanhóis ou suíços – entretanto só vieram alemães. Os cinco primeiros artigos regulamentam a distribuição dos lotes ou prazos, divididos em quatro classes com organização relativa à proximidade do Palácio: a primeira classe fica próximo ao paço, testada de 5 a 10 braças e 70 de fundo; terrenos de segunda classe, próximo à povoação e colateralmente à Estrada Real, testada de 15 braças e 100 de fundo; terceira classe englobavam os terrenos colaterais à Calçada no Alto da Serra com testada de 15 braças por 100 de fundo; o restante da fazenda constituiria a quarta classe para lavradores, cujos quarteirões seriam divididos em prazos com superfície variando de 5.000 braças a 20.000 braças [23].
VILA IMPERIAL DE PETRÓPOLIS, PROJETO DE 1846
O edifício palaciano e a vila colonial são o centro de convergência da malha urbana, embora no decreto imperial fundador de Petrópolis é possível notar uma reserva dual das terras – terreno para um palácio, com dependências e jardins, e terrenos para aforados e particulares, depois a autorização para a demarcação de terra para uma igreja e cemitério. Assim, Petrópolis nasce com o palácio como referencial, uma orientação mais política e não tanto religiosa, pelo decreto fosse bem explicito a necessidade da Igreja “com invocação a São Pedro de Alcântara” no projeto. Petrópolis estaria próximo a um método português de fundação de cidades, chamadas cidades reais. No século XVI, utilizava-se em Portugal recurso dos colonos e donatários. A Coroa, conforme declarado nas cartas de doação, deixava aos donatários o papel de criação de vilas sem a necessidade de licença real. Eram cidades reais, fundadas pelo Governo Geral, pela Coroa, e diretamente subordinados a esta funcionando como centros regionais. A proximidade de Petrópolis com esta tradição refere-se ao elemento determinador na sua fundação. O traço da cidade, mostrou-se tentacular, reflexo da topografia e reflexo da elite imperial. As ruas são de eixo, de ligação. Ruas que portavam nomes que refletiam a territorialidade da elite imperial. Enquanto elemento urbano, a praça foi um elemento marcante no projeto de Koeler. Quinze praças ao todo estavam no projeto, cinco no interior ou próximo da Vila Imperial e Thereza (os dois núcleos primordiais do projeto) áreas de precedência dos edifícios palacianos e do descanso da elite – praça de S. Pedro de Alcântara, na área da atual praça Princesa Isabel e da catedral; antiga praça D. Afonso, atual praça Rui Barbosa ou da Liberdade; praça da Confluência; praça do imperador: no local das atuais praças D. Pedro II e dos Expedicionários; praça de Nassau, atual praça Oswaldo Cruz. As outras dez, assinaladas no projeto desapareceram. O projeto a cidade de Petrópolis contemplava várias praças, mas apenas o núcleo central foi privilegiado nesse aspecto, pelo seu centro podemos aferi-la como cidade política, fora o centro toda a cidade se volta para a casa, a produção espacial apontava a convivência familiar, distante da vida pública longe das praças, apontado para o conceito de cidade doméstica. Na sua origem, Petrópolis adaptou-se ao relevo. Diverge da tradicional configuração citadina portuguesa, onde as aldeias tinham seu centro a praça, com o edifício religioso em proeminência, em pontos mais elevamos; diferente da vivencia luso brasileira de criar na encosta povoados agrupados a partir de um prédio religioso. Petrópolis teve como contingencia o relevo e progrediu entre vales [24].
CONCLUSÃO
O contexto em que a cidade de Petrópolis surge, está dentro de uma onda de povoamento da região serrana Fluminense. Feita pelos cafeicultores, pelos colonos e pelos escravos durante o século XIX, nos sertões do leste e do oeste, quando esboçada a rede urbana fluminense. O projeto Imperial de povoamento e de colonização tinha o suporte da aristocracia, a força política do Império e da Nação, bem como dos funcionários ou burocracia militar que definiam os planos da ocupação das localidades e dos núcleos coloniais através de uma estratégia controle sobre a natureza e os índios. Os núcleos, financiados pelo Tesouro através das Companhias de Colonização, eram promotoras de mão de obra livre e barata. O pouco sucesso como colónia agrícola deu lugar ao empenho dos colonos em atividades no centro urbano. O desenho resultante será inspirado no modelo progressista da primeira metade do século XIX – anéis concêntricos, espaço aberto para facilitar a higiene, disposição simples das funções humanas para impressionar e a austeridade estética do progresso [25].
A cidade verdadeiramente nasceu em conceito, por decreto, uma verbalização de intenções, e depois em desenho. Esse projeto enquanto domínio de incerteza, que era o de colocar determinado programa, entre um relevo tão acentuado, levava a confiança da possibilidade de adequar um traçado que atendesse as expectativas que nele se impunham. Existia de facto a necessidade da centralidade do palácio imperial, para onde, e de onde, os direcionamentos políticos haveriam convergir e também, nesse conciso decreto estava a referência à construção da igreja com dimensões bem definidas. Pelo menos a presença da Igreja e do Estado deveriam se fazer sentir em meio à nova povoação, em conceito. A compra do terreno, por parte de Pedro I, e também o motivo de fundo para a autorização do projeto por parte de Pedro II era a construção do Palácio Imperial, uma mudança sazonal de centro de poder para aquela região e por isso a escolha do sitio face o clima faria sentido. Face a presença do palácio imperial, e um decrescendo de “conceito social” dos espaços pelo afastamento, resulta também em uma demonstração noção de hierarquia, a pretendia para aquela época. Na passagem, do decreto para o projeto, marcante na componente urbana é a proliferação de praças, que deveriam representar um modo urbano que permitia aos habitantes a fruição intensa do espaço público e permitia a integração diferenciada entre a habitação e os edifícios públicos. No final conseguimos intuir um conjunto de processos que têm por base caraterísticas do urbanismo português, mas no final e fruto da contemporaneidade desse projeto, sobretudo com o processo de transformação social e urbana advindos da novidade, e necessidade, que foi a industrialização, a vocação da cidade original muda, e a forma se transmuta, por isso a pesquisa desses legados é complexa e no caso de Petrópolis as referências, neste grau de análise, são remotas.
BIBLIOGRAFIA
[1] Fridman, F. Cartografia fluminense no Brasil imperial. Anais do I Simpósio Brasileiro de Cartografia Histórica. Paraty, p. 14-15, 2011.
[2] Teixeira, M. C. O Património Urbano dos Países de Língua Portuguesa. Raízes e Manifestações de um Património Comum. Simpósio Luso-Brasileiro de Cartografia Histórica, v. 3, p. 1-13, 2009.
[3] Ambrozio, J. C. G. O presente e o passado no processo urbano da cidade de Petrópolis. Uma história territorial. Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo, p. 3, 2008
[4] Rossa, W. A urbe e o traço: uma década de estudos sobre o urbanismo português. Almedina, 2002.
[5] ibidem, p. 370-375
[6] Bueno, B. P. S. Particularidades do processo de colonização da América Espanhola e Portuguesa. Anais: Seminário de História da Cidade e do Urbanismo, v. 4, n. 3, p. 505-514, 2012.
[7] Reis Filho, N. G. Contribuição ao estudo da evolução urbana do Brasil, 1500-1720. Pini, p. 183 -184, 2001.
[8] ibidem, p. 185-186
[9] Bueno, 2012, op. cit., p. 506
[10] Reis Filho, op. cit., p. 187-188
[11] Rossa, 2002, op. cit., p. 384-387
[12] Delson, R. M. Novas vilas para o Brasil-Colônia: planejamento espacial e social no Século XVIII. Brasília: ALVA-CIORD, p. 95-96, 1997.
[13] ibidem, p. 97-101
[14] Bueno, B. P. S. Desenho e desígnio: o Brasil dos engenheiros militares (1500-1822). Desenho e desígnio: o Brasil dos engenheiros militares (1500-1822), p. 294, 2001.
[15] ibidem, p. 295
[16] Delson, 1997, op. cit., p. 102-103
[17] Correia, J. E. H. Vila Real de Santo António: urbanismo e poder na política pombalina. 1997.
[18] Fridman, F. Breve história do debate sobre a cidade colonial brasileira. Anais: Seminário de História da Cidade e do Urbanismo, v. 8, n. 5, p. 67, 2004
[19] Fridman, F. De núcleos coloniais a vilas e cidades: Nova Friburgo e Petrópolis. Anais: Encontros Nacionais da ANPUR, v. 9, p. 610-612, 2013.
[20] Fridman, 2013, op. cit., p. 615
[21] Fridman, 2013, op. cit., p. 616
[22] Abreu, A. I. da C. A morte de Koeler: a tragédia que abalou Petrópolis. Petrópolis, Fund. Petrópolis, p. 43, 1996.
[23] Fridman, 2013, op. cit., p. 617-618
[24] Ambrozio, 2008, op. cit., p. 232-244
[25] Fridman, 2013, op. cit., p. 620
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